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Estudantes da UFSC contra a extrema-direita

No início da semana passada, avaliamos que existia “uma grande mobilização começando na UFSC contra a extrema-direita, com indícios de que pode tomar a proporção das maiores lutas de nossa história“.

Nessa semana que passou, perdemos as contas da quantidade de assembleias estudantis realizadas na UFSC. Nesse momento, temos pelo menos nove paralisações (Pedagogia, Psicologia, Pós-Graduação em Educação, Filosofia, Pós-Graduação em Filosofia, Ciências Biológicas, Cinema, Ciências Sociais e Arquitetura), em cinco Centros diferentes, todas elas com suas próprias programações de debates e atividades. Outros cursos ainda tiraram dias de paralisação, como Design e Animação. Na quarta-feira, uma plenária no CFH lotou os três andares do prédio de aulas. Na quinta, a Assembleia Geral de Estudantes da UFSC reuniu 975 estudantes que fizeram credenciamento, além de dezenas ou centenas de pós-graduandos e demais pessoas que participaram da assembleia.

No texto publicado no início da semana, elencamos argumentos para manter a pauta em torno do #EleNão e do combate à extrema-direita, ao invés de centrar esforços na campanha eleitoral de Haddad. Entre eles, a importância de agregar um movimento de massas que inclua toda as críticas feitas ao PT pela esquerda; entender que Bolsonaro é apenas uma liderança de um movimento de extrema-direita maior, que envolve interesses de diversos atores; e por fim não cair na ilusão de que a extrema-direita pode ser derrotada através das urnas, mas enxergar que essa tarefa exigirá nossa articulação e luta para além do calendário eleitoral.

Na Assembleia Geral, prevaleceu um posicionamento de apoio ao candidato Haddad, mas vários dos cursos que estão em luta mantiveram uma posição de independência e de horizonte para além do momento eleitoral. A Assembleia também tirou posições importantes para a articulação dos cursos em luta, a formação de um comitê de autodefesa, a paralisação geral de um dia na sexta (26/10) e a convocação de outra Assembleia para o início do ano que vem, independente de quem ganhar as eleições.

Um dos debates fundamentais nesse momento é a decisão por realizar as paralisações de curso ou não.

Acompanhamos, durante essa semana, três formas de crítica às paralisações, por supostamente promover mais ataques da extrema-direita; por serem usadas para deslegitimar a universidade pública; ou porque a necessidade é de mobilização para fora do meio universitário. Ainda assim, consideramos que as paralisações são instrumentos fundamentais nesse momento.

Entendemos, como argumentaram as estudantes de Filosofia, que paralisar não é sinônimo de parar. Estamos em paralisações para agir, inclusive fora dos muros da universidade. Os dias em que ficamos sem aulas são um momento de intenso aprendizado, em que buscamos interpretar coletivamente a realidade a nossa volta e pensamos como intervir nela. 

No fim, não é por outro motivo que a universidade é mantida pelo conjunto da sociedade. Ela forma profissionais, também, mas tem uma tarefa muito maior, que é mobilizar ensino, pesquisa e extensão para compreender os principais dilemas da sociedade e sugerir caminhos. Na encruzilhada em que nos encontramos, entre a luta social ou a barbárie, o papel social das estudantes e da própria universidade é tomar posição!

Nossa ação será atacada por nossos adversários seja ela qual for – e não podemos acreditar que nosso silêncio trará qualquer tipo de conquista. Se temos uma universidade pública hoje, é porque ousamos enfrentar os interesses de mercado, mesmo contra a crítica das elites ou a repressão política. Nesse momento de levante da extrema-direita, não podemos achar que passaremos despercebidas. O projeto de educação deles já está definido e muito bem divulgado: pretendem privatizar toda a educação pública, impedir a organização sindical e vetar qualquer tipo de ensino, pesquisa e extensão de caráter transformador ou vinculados aos movimentos sociais. Do nosso lado, só podemos escolher se haverá resistência a eles ou não.

No limite, a única garantia real de que impediremos a privatização de nossos bens comuns – ou de que manteremos nossas liberdades políticas frente ao avanço autoritário – é nossa capacidade de organizar uma greve geral no momento necessário. Aquilo que fazemos hoje é tanto uma demonstração de força, quanto um acúmulo para a próxima etapa da luta. Após um ano sem grandes mobilizações na Universidade, muitas estudantes participaram de sua primeira assembleia nessa última semana e se tornaram companheiras, ombro a ombro na resistência. Nosso aprendizado coletivo é que dirá se teremos capacidade de responder ao que o momento histórico exigir.

#EleNão!
PARA DERROTAR A EXTREMA-DIREITA, ORGANIZAÇÃO E LUTA!
MAIS FORTES SÃO OS PODERES DO POVO!

Coletiva Centospé
Florianópolis, 21 de outubro de 2018

 

Eleitores do Bolsonaro agridem uma estudante da UFSC

Na última quinta-feira, dia 11 de outubro, uma de nossas militantes foi agredida por dois eleitores de Bolsonaro nas proximidades da UFSC. Ela pedia carona na entrada do Córrego Grande, na esquina do Restaurante Dona Benta, onde entrou no carro (Corsa prata, placa não identificada) e seguiu no sentido Lagoa da Conceição, por volta das 18h40. Eram dois jovens brancos, ambos com aproximadamente 27 anos de idade, por volta de 1,75 e barba comprida com cabelos escuros, estilo coque samurai

Depois de rodarem alguns minutos, os agressores perguntaram se ela havia votado no Bolsonaro. Ao dizer que não havia votado e que não concorda com o que o candidato representa, eles a xingaram com violência, inclusive enquanto ela afirmava que também não votava no PT. Após isso, eles a arremessaram com violência para fora do carro, nesse momento parado, fazendo com que o impacto rasgasse sua calça na região dos joelhos e machucasse essa região, assim como as mãos.

Sabemos que, assim como dezenas de outras histórias de violência realizadas por defensores de Bolsonaro, essa pode ser respondida com descrédito e informações falsas. Essa ação sistemática de negação serve apenas para aqueles que não querem acreditar ou admitir a violência legitimada pelos discursos desse candidato. A verdade é que os discursos de sua campanha estimulam o ódio e o extermínio.

Iniciativas de mapeamento da violência dos eleitores de Bolsonaro indicam dezenas de casos por todo o país (aqui, aqui, aqui e aqui), como o assassinato do Mestre Moa do Katendê na primeira noite pós primeiro turno, representante da cultura negra e popular do país. Muitas e muitos de nós já acompanhamos de perto essa violência, que vem atingindo pessoas próximas a nós.

Chamamos todas e todos para terem cuidado. Militantes de esquerda, feministas, todas as pessoas LGBTI+, todo o povo negro, indígena, imigrantes ou qualquer pessoa que se oponha a Bolsonaro. Porém, mais do que cuidado, recomendamos força. Precisamos construir redes de apoio e grupos para práticas de autodefesa, nos mantendo de pé a partir da coletividade. Não iremos nos calar e nem vamos nos esconder! Cada ameaça e cada violência da extrema-direita será respondida com mais disposição para a luta, mais vontade de tomar as ruas, mais dedicação para a organização popular.

#EleNão!

PARA DERROTAR A EXTREMA-DIREITA, ORGANIZAÇÃO E LUTA!
MAIS FORTES SÃO OS PODERES DO POVO!

Coletiva Centospé,
Florianópolis, 14 de outubro de 2018.

As eleições para a Reitoria e a disputa pela autonomia universitária

A consulta à comunidade universitária para a eleição de um novo reitor na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) não é uma consequência imediata ou automática da vacância do cargo após os eventos de 2017: ela só está ocorrendo por conta da pressão exercida através da Comissão Unificada de Mobilização, que fez vigílias contra a perspectiva de que o Conselho Universitário poderia nomear um novo reitor de forma autocrática. Agora, consideramos fundamental interpretar alguns elementos do momento político, discutir o significado da autonomia universitária, caracterizar as chapas em disputa pela Reitoria e expressar nossa postura frente à eleição e à futura Reitoria.

A autonomia universitária

A questão da autonomia é tema central na UFSC neste momento, especialmente em decorrência do abuso de poder do Estado que a intervenção da Polícia Federal e do Judiciário na gestão universitária representam. Poucos meses depois destes acontecimentos em nossa universidade, a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) também foi alvo de uma operação coercitiva da Polícia Federal que tomou ares de condenação na grande mídia, mesmo quando as investigações ainda estavam no início, ocorrendo em sigilo. A atual situação da Universidade Federal do ABC (UFABC) é outro elemento para o debate sobre autonomia, uma vez que esta universidade passou pelo processo de escolha de seus dirigentes há meses, mas não houve nomeação pelo Ministério da Educação do reitor eleito, o que motivou um indicativo de greve docente.

Esse não é um tema novo, pois nos remete à memória de resistência às intervenções autoritárias do Estado e das polícias nas universidades durante a ditadura civil-militar, período de grande protagonismo estudantil. Hoje, no entanto, o termo parece ter se tornado um grande jargão usado para defender interesses diversos. Embora a Constituição assegure às universidades autonomia didático-científica, administrativa, e de gestão financeira e patrimonial, diferentes maneiras de interpretar e efetivar essa autonomia da Universidade frente ao Estado e ao mercado possibilitam que cada campo político utilize o termo para defender projetos bastante diferentes de Universidade. 

A gestão Cancellier, por exemplo, usou de sua autonomia para realizar parcerias entre a Universidade e o governo de Israel, abrindo espaço para que o país oferecesse aulas e cursos aqui, bem como para defender parcerias privadas com empresas israelenses. De nada serve autonomia para aliar-se a Estados genocidas sem qualquer princípio de democracia interna, já que a proposta não foi debatida pela comunidade, ainda mais quando isso ainda representa uma submissão a interesses de mercado. Poderíamos fazer comentários similares a respeito de como as gestões Cancellier e Ubaldo decidiram permitir o uso de áreas da UFSC para treinamento militar ou como consideraram que a alocação de laboratórios e campi dentro de condomínios empresariais representavam um novo modelo institucional. A “autonomia universitária” por si só, portanto, não é garantia de uma universidade mais democrática ou popular.

Na UFSC, os órgãos deliberativos Conselho de Curadores e Conselho Universitário (CUn) são espaços-chave para exercer a autonomia financeira e administrativa. No entanto, predominam neles os professores, que compõem numericamente a menor categoria em comparação com o corpo discente e de servidores técnico-administrativos da instituição, enquanto a comunidade externa não tem praticamente espaço algum. Além de lutar por mais democracia interna, precisamos avançar o debate para o controle social da universidade, isto é, a capacidade da comunidade externa, do povo que vive nos bairros do entorno, da classe trabalhadora da região e dos movimentos sociais de nosso Estado influenciarem os rumos da instituição. A participação da comunidade nestas e em outras instâncias universitárias pode ser um caminho para o controle social, como por exemplo na Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), que surgiu a partir de demandas populares e atualmente conta com a participação da comunidade externa em seus processos decisórios, incluindo as eleições para a Reitoria. 

Discutir a autonomia da universidade é particularmente relevante neste período de desmonte das universidades públicas, em meio a um avanço autoritário do Estado e às iniciativas privatistas. Isso envolve exigir os recursos necessários para nosso funcionamento, sem rabo preso na cobrança ao governo, mas também a autonomia na proposta político-pedagógica, de forma a direcionar nossa formação, nossa extensão e nossas pesquisas para rumos que não sejam determinados pelas necessidades do mercado, nem mesmo por certos projetos de Estado, quando sabemos que essa é uma estrutura de poder das classes dominantes. Mesmo as ações em que temos alguns avanços, como o aumento das vagas no ensino superior público ou as ações afirmativas para ingresso, são conquistas arrancadas do Estado pela luta popular.

A partir dessa interpretação da autonomia universitária, passamos a analisar as candidaturas nas eleições à reitoria de 2018.

Os candidatos e seus campos políticos

Os candidatos à consulta pública para a Reitoria da UFSC no segundo turno são o atual reitor pro tempore, Ubaldo Cesar Balthazar, e o diretor do Centro Sócio-Econômico (CSE), Irineu Manoel de Souza. Ambos posicionam-se a favor de uma universidade autônoma, mas cada um entende o termo à sua própria maneira: 

A candidatura de Ubaldo dá continuidade à última gestão (o mote “A UFSC pode mais” é o mesmo utilizado na campanha de 2015 de Cancellier) e se propõe a devolver a universidade ao “equilíbrio”, uma alternativa de ajuste e acomodação ao cenário político de fortes retrocessos que vivemos. Enquanto reitor, Ubaldo se posiciona no máximo de forma tímida frente aos ataques do Governo Federal, quando pressionado. Em sua gestão, saudou a iniciativa privada dentro da universidade ao colaborar com a instalação do campus Joinville em um condomínio industrial privado, declarando sua satisfação com a criação de “um celeiro de oportunidades, com indústria e centenas de jovens estudantes prontos a responder às questões apontadas pelo mercado. Mesmo durante a campanha eleitoral, recusou a participação no debate organizado pela entidades estudantis e não respondeu à Carta de Reivindicações da Associação de Pós-Graduandos (APG). Nas últimas semanas, sua gestão descumpriu todas as promessas feitas relativas à situação da Moradia Estudantil na UFSC, onde sua gestão manteve o legado recebido de inexplicáveis vagas ociosas, infestação de ratos, vazamentos e goteiras. Acreditamos que isso demonstra uma forte tendência a uma gestão incapaz de ouvir estudantes, em particular as demandas por permanência, mas que está predisposta a agradar o Governo Federal e estimular o caminho de submissão de nossa instituição aos interesses de uma minoria.

Quanto à candidatura de Irineu, identificamos pontos positivos em seu programa de chapa como a centralidade nas pautas por permanência estudantil, defendendo avanços em temas fundamentais como Restaurante Universitário, Moradia Estudantil, Ações Afirmativas e as festas. Posiciona-se contra a presença da Polícia Militar nos campi, defendendo o reestabelecimento do cargo de segurança institucional para as Universidades Federais, e tem demonstrado capacidade de se posicionar de forma crítica às políticas do Governo Federal, às parcerias público-privadas e às Fundações de Apoio, outra porta de entrada do interesse privado nas universidades. Desde o início do debate sobre a EBSERH, foi uma voz contrária à adesão do Hospital Universitário à empresa pública de direito privado – após mais de um ano de funcionamento pela EBSERH, o HU apresenta graves problemas de falta de contratações e está esporadicamente com sua emergência fechada. Cabe ressaltar, por fim, sua postura aberta de apoio à redução da jornada de trabalho de servidores técnico-administrativos e ao aumento de sua representação nas instâncias da Universidade.

Nossa posição frente à disputa

A Coletiva Centospé acredita em um projeto de Universidade radicalmente diferente do atual, que seja voltado diretamente às necessidades populares e à transformação da sociedade. Acreditamos que é papel do movimento estudantil construir uma força social e política autônoma, capaz de avançar neste objetivo estratégico sem abrir mão de princípios, sem ceder nossas forças, nem submeter os interesses estudantis e populares à conciliação com nossos inimigos de classe.

Nesta quarta, votaremos no candidato Irineu (80) e convidamos a comunidade universitária a votar junto a nós, pelas diferenças expostas em seus projetos de Universidade e pela perspectiva de um outro patamar de disputa de nossas demandas frente à futura Reitoria. Independente de quem levar a eleição, seguiremos como oposição de esquerda dentro do movimento estudantil e dos espaços de construção coletiva das categorias na UFSC, pois qualquer vitória concreta só pode ser consequência de organização e luta independente, capaz de alterar a correlação de forças e arrancar conquistas.

Mais fortes são os poderes do povo!

Coletiva Centospé,

09 de abril de 2018