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Só a luta popular põe freio na barbárie: todo apoio à luta na UFFS

Na última quinta-feira (29), o mesmo governo que desmonta a educação pública, corta verbas em ciência e tecnologia, propõe a privatização da gestão das universidades federais e persegue política e ideologicamente as e os estudantes e trabalhadores, lançou sua ofensiva de absurdos sobre a Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS).

Bolsonaro nomeou para o cargo de reitor um professor fundamentalista religioso, apoiador radical do governo, academicamente medíocre e que fez uma votação insignificante quando da eleição para a reitoria. Marcelo Recktenvald, que já usou verba pública para estudar “coaching cristão” na instituição, agora é nomeado interventor do governo em mais essa manobra autoritária e antipovo.

A UFFS, instituição cuja história é ligada às lutas populares, erguida pela força e pela militância incansável de estudantes e trabalhadores/as do campo, é marcada pelo já histórico descaso institucional e midiático com o interior do país. Um descaso que envolve, inclusive, as organizações de esquerda e os movimentos sociais, mesmo os ligados à educação e às instituições de ensino, que pouco ou nada articulam e organizam junto ao brasil periférico e rural.

A Universidade que se estende em três estados brasileiros, com cinco campi e mais de oito mil alunos, é uma instituição alinhada aos povos do campo e da floresta, uma demanda e uma conquista da nossa classe e a força das e dos estudantes de pronto mostrou resposta a mais esse absurdo.

Agora, desde o anúncio desta intervenção do governo Bolsonaro, a comunidade finca o pé pela nomeação da chapa eleita, exigindo a retirada imediata do interventor bolsonarista da cadeira da reitoria.

Com combatividade e ação direta, alunas/os, servidoras/es, técnicos e movimentos sociais ocuparam já na sexta-feira a reitoria da Universidade, estendendo em seguida a ocupação para o Campus Cerro Largo. Assembleias, marchas, piquetes e mais ocupações estão na agenda da luta e toda solidariedade é necessária diante da ofensiva do governo federal contra a autonomia.

SAUDAMOS as e os estudantes em luta, com toda solidariedade e com todo apoio;

APONTAMOS que é com ação direta e de base, sem negociações com governos e patrões, que o movimento estudantil deve pautar o caminho das lutas em todo o país. Só a luta popular pode colocar freio no avanço dos de cima sobre nosso direito ao futuro;

CONVOCAMOS coletivos, centros e diretórios acadêmicos, partidos, grupos e organizações a se somarem na divulgação e no apoio à luta na fronteira sul

E seguimos de pé, lado a lado, ombro a ombro e de punho erguido diante de mais esse ataque! A educação do povo não se vende, se defende.

TODO APOIO À LUTA NA UFFS!

NÃO À INTERVENÇÃO! PELA AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA!

NÃO AO FUTURE-SE E AOS DESMONTES NA EDUCAÇÃO PÚBLICA!

FORA MARCELO!

Assinam:

Resistência Popular Estudantil – Porto Alegre/RS
Resistência Popular – Fronteira Sul
Juventude Rosa Negra – Belo Horizonte
Resistência Popular Alagoas
Resistência Popular Estudantil – RJ
Resistência Popular Estudantil – Marília
Coletiva Centospé – Florianópolis/SC

As eleições para a Reitoria e a disputa pela autonomia universitária

A consulta à comunidade universitária para a eleição de um novo reitor na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) não é uma consequência imediata ou automática da vacância do cargo após os eventos de 2017: ela só está ocorrendo por conta da pressão exercida através da Comissão Unificada de Mobilização, que fez vigílias contra a perspectiva de que o Conselho Universitário poderia nomear um novo reitor de forma autocrática. Agora, consideramos fundamental interpretar alguns elementos do momento político, discutir o significado da autonomia universitária, caracterizar as chapas em disputa pela Reitoria e expressar nossa postura frente à eleição e à futura Reitoria.

A autonomia universitária

A questão da autonomia é tema central na UFSC neste momento, especialmente em decorrência do abuso de poder do Estado que a intervenção da Polícia Federal e do Judiciário na gestão universitária representam. Poucos meses depois destes acontecimentos em nossa universidade, a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) também foi alvo de uma operação coercitiva da Polícia Federal que tomou ares de condenação na grande mídia, mesmo quando as investigações ainda estavam no início, ocorrendo em sigilo. A atual situação da Universidade Federal do ABC (UFABC) é outro elemento para o debate sobre autonomia, uma vez que esta universidade passou pelo processo de escolha de seus dirigentes há meses, mas não houve nomeação pelo Ministério da Educação do reitor eleito, o que motivou um indicativo de greve docente.

Esse não é um tema novo, pois nos remete à memória de resistência às intervenções autoritárias do Estado e das polícias nas universidades durante a ditadura civil-militar, período de grande protagonismo estudantil. Hoje, no entanto, o termo parece ter se tornado um grande jargão usado para defender interesses diversos. Embora a Constituição assegure às universidades autonomia didático-científica, administrativa, e de gestão financeira e patrimonial, diferentes maneiras de interpretar e efetivar essa autonomia da Universidade frente ao Estado e ao mercado possibilitam que cada campo político utilize o termo para defender projetos bastante diferentes de Universidade. 

A gestão Cancellier, por exemplo, usou de sua autonomia para realizar parcerias entre a Universidade e o governo de Israel, abrindo espaço para que o país oferecesse aulas e cursos aqui, bem como para defender parcerias privadas com empresas israelenses. De nada serve autonomia para aliar-se a Estados genocidas sem qualquer princípio de democracia interna, já que a proposta não foi debatida pela comunidade, ainda mais quando isso ainda representa uma submissão a interesses de mercado. Poderíamos fazer comentários similares a respeito de como as gestões Cancellier e Ubaldo decidiram permitir o uso de áreas da UFSC para treinamento militar ou como consideraram que a alocação de laboratórios e campi dentro de condomínios empresariais representavam um novo modelo institucional. A “autonomia universitária” por si só, portanto, não é garantia de uma universidade mais democrática ou popular.

Na UFSC, os órgãos deliberativos Conselho de Curadores e Conselho Universitário (CUn) são espaços-chave para exercer a autonomia financeira e administrativa. No entanto, predominam neles os professores, que compõem numericamente a menor categoria em comparação com o corpo discente e de servidores técnico-administrativos da instituição, enquanto a comunidade externa não tem praticamente espaço algum. Além de lutar por mais democracia interna, precisamos avançar o debate para o controle social da universidade, isto é, a capacidade da comunidade externa, do povo que vive nos bairros do entorno, da classe trabalhadora da região e dos movimentos sociais de nosso Estado influenciarem os rumos da instituição. A participação da comunidade nestas e em outras instâncias universitárias pode ser um caminho para o controle social, como por exemplo na Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), que surgiu a partir de demandas populares e atualmente conta com a participação da comunidade externa em seus processos decisórios, incluindo as eleições para a Reitoria. 

Discutir a autonomia da universidade é particularmente relevante neste período de desmonte das universidades públicas, em meio a um avanço autoritário do Estado e às iniciativas privatistas. Isso envolve exigir os recursos necessários para nosso funcionamento, sem rabo preso na cobrança ao governo, mas também a autonomia na proposta político-pedagógica, de forma a direcionar nossa formação, nossa extensão e nossas pesquisas para rumos que não sejam determinados pelas necessidades do mercado, nem mesmo por certos projetos de Estado, quando sabemos que essa é uma estrutura de poder das classes dominantes. Mesmo as ações em que temos alguns avanços, como o aumento das vagas no ensino superior público ou as ações afirmativas para ingresso, são conquistas arrancadas do Estado pela luta popular.

A partir dessa interpretação da autonomia universitária, passamos a analisar as candidaturas nas eleições à reitoria de 2018.

Os candidatos e seus campos políticos

Os candidatos à consulta pública para a Reitoria da UFSC no segundo turno são o atual reitor pro tempore, Ubaldo Cesar Balthazar, e o diretor do Centro Sócio-Econômico (CSE), Irineu Manoel de Souza. Ambos posicionam-se a favor de uma universidade autônoma, mas cada um entende o termo à sua própria maneira: 

A candidatura de Ubaldo dá continuidade à última gestão (o mote “A UFSC pode mais” é o mesmo utilizado na campanha de 2015 de Cancellier) e se propõe a devolver a universidade ao “equilíbrio”, uma alternativa de ajuste e acomodação ao cenário político de fortes retrocessos que vivemos. Enquanto reitor, Ubaldo se posiciona no máximo de forma tímida frente aos ataques do Governo Federal, quando pressionado. Em sua gestão, saudou a iniciativa privada dentro da universidade ao colaborar com a instalação do campus Joinville em um condomínio industrial privado, declarando sua satisfação com a criação de “um celeiro de oportunidades, com indústria e centenas de jovens estudantes prontos a responder às questões apontadas pelo mercado. Mesmo durante a campanha eleitoral, recusou a participação no debate organizado pela entidades estudantis e não respondeu à Carta de Reivindicações da Associação de Pós-Graduandos (APG). Nas últimas semanas, sua gestão descumpriu todas as promessas feitas relativas à situação da Moradia Estudantil na UFSC, onde sua gestão manteve o legado recebido de inexplicáveis vagas ociosas, infestação de ratos, vazamentos e goteiras. Acreditamos que isso demonstra uma forte tendência a uma gestão incapaz de ouvir estudantes, em particular as demandas por permanência, mas que está predisposta a agradar o Governo Federal e estimular o caminho de submissão de nossa instituição aos interesses de uma minoria.

Quanto à candidatura de Irineu, identificamos pontos positivos em seu programa de chapa como a centralidade nas pautas por permanência estudantil, defendendo avanços em temas fundamentais como Restaurante Universitário, Moradia Estudantil, Ações Afirmativas e as festas. Posiciona-se contra a presença da Polícia Militar nos campi, defendendo o reestabelecimento do cargo de segurança institucional para as Universidades Federais, e tem demonstrado capacidade de se posicionar de forma crítica às políticas do Governo Federal, às parcerias público-privadas e às Fundações de Apoio, outra porta de entrada do interesse privado nas universidades. Desde o início do debate sobre a EBSERH, foi uma voz contrária à adesão do Hospital Universitário à empresa pública de direito privado – após mais de um ano de funcionamento pela EBSERH, o HU apresenta graves problemas de falta de contratações e está esporadicamente com sua emergência fechada. Cabe ressaltar, por fim, sua postura aberta de apoio à redução da jornada de trabalho de servidores técnico-administrativos e ao aumento de sua representação nas instâncias da Universidade.

Nossa posição frente à disputa

A Coletiva Centospé acredita em um projeto de Universidade radicalmente diferente do atual, que seja voltado diretamente às necessidades populares e à transformação da sociedade. Acreditamos que é papel do movimento estudantil construir uma força social e política autônoma, capaz de avançar neste objetivo estratégico sem abrir mão de princípios, sem ceder nossas forças, nem submeter os interesses estudantis e populares à conciliação com nossos inimigos de classe.

Nesta quarta, votaremos no candidato Irineu (80) e convidamos a comunidade universitária a votar junto a nós, pelas diferenças expostas em seus projetos de Universidade e pela perspectiva de um outro patamar de disputa de nossas demandas frente à futura Reitoria. Independente de quem levar a eleição, seguiremos como oposição de esquerda dentro do movimento estudantil e dos espaços de construção coletiva das categorias na UFSC, pois qualquer vitória concreta só pode ser consequência de organização e luta independente, capaz de alterar a correlação de forças e arrancar conquistas.

Mais fortes são os poderes do povo!

Coletiva Centospé,

09 de abril de 2018

Centospé comenta: “Como o Perini se prepara para receber a UFSC em março” (Jornal ANotícia)

Leia a reportagem: “Como o Perini se prepara para receber a UFSC em março” (Jornal ANotícia)

O jornal A Notícia de Joinville publicou no final do ano passado uma longa matéria sobre o campus da UFSC na cidade. Nela, ficamos sabendo que a Universidade vai pagar 412 mil reais por mês para um condomínio privado de empresas receber as aulas da UFSC nos próximos cinco anos, totalizando 24,720 milhões de reais no período, que ainda podem ser renovados por mais 5 anos.

Ao invés da Universidade construir seu próprio campus, está dando todo esse dinheiro para o Perini Business Park construir três blocos que recebam os milhares de estudantes de Joinville. O montante gasto se soma ao histórico de obras inconclusas no campus próprio e os aluguéis de prédios desde 2009, totalizando mais de 70 milhões de reais gastos sem a construção de sequer uma sala de aula própria. Nesta segunda (05/03), a UFSC realiza ato solene de instalação do campus, com presença do reitor pró-tempore, Ubaldo Balthazar.

Mas o gasto financeiro não é o que há de mais sério em risco, mesmo com a redução anunciada de 27 milhões de reais no Orçamento da UFSC para 2018. Enquanto constrói toda a estrutura para abrigar a UFSC Joinville, o Perini Business Park e os executivos de suas 150 empresas já conversam e planejam o que esperam da Universidade.

Para o empresariado, não há dúvida de que essa é uma ótima oportunidade de conseguir mão de obra barata, de economizar custos na formação profissional e principalmente na pesquisa e desenvolvimento, cooptando o recurso público e toda a estrutura e capacidade humana da Universidade para resolver seus problemas privados – obviamente, com usufruto privado de todo o lucro decorrente. Os princípios da Universidade pública, o olhar para as necessidades populares, a formação humanista e generalista, a autonomia na produção científica, tecnológica e artística ficam todos extremamente ameaçados por essa relação.

A alocação de um campus inteiro de uma Universidade Federal dentro de um business park privado é um perigoso precedente, um ousado passo na capacidade do mercado em direcionar a educação pública, que se soma a iniciativas nefastas como cobranças em especializações, parcerias público-privadas, o empresariamento da formação através das Empresas Júnior, a ação das fundações, as empresas públicas de direito privado (como a EBSERH) e as tentativas mais explícitas de privatização.

Assim como existe formação para os interesses do mercado, existe uma formação para as necessidades das classes oprimidas. Essa disputa atravessa tudo que acontece na Universidade, incluindo nossos currículos formais, os temas discutidos em sala de aula, as saídas de campo, os estágios, a extensão universitária, a pesquisa nos núcleos e laboratórios. Em Joinville, um dos lados da disputa vai começar a jogar em casa, mas pouca gente tem levantado a voz contra a vantagem desleal. Defendemos a Autonomia Universitária como um princípio que engloba a autonomia financeira, autonomia de gestão e autonomia pedagógica, que só podem existir com independência das forças do mercado, pela garantia do orçamento público na mão da UFSC, de estrutura própria e de currículos e propostas pedagógicas planejadas pela comunidade universitária, pelas comunidades do entorno e pelos movimentos sociais.

Universidade pública é para servir os interesses do povo!
Fora iniciativa privada da UFSC!

Coletiva Centospé
Março de 2018